Mulheres na Maçonaria não são um tema novo. Há registros históricos de mulheres como maçons operativas, bem como menções a estas no Poema Regius[1] (Séc. XIV) e no Manuscrito de York N.4[2] (Séc. XVII). Assim, somente a partir da Constituição de Anderson (1723),[3] o veto a mulheres passa a existir, mas não em absoluto.
Ainda no Séc. XVIII, surgiu o Rito de Adoção e as Lojas de Adoção, específicas para mulheres, a partir do Grande Oriente de França. E entre os Séculos XVIII e XIX, tem-se casos de mulheres iniciadas em lojas convencionais, como Elizabeth Aldworth, iniciada na Irlanda; Helene Hadik-Barkóczy, na Hungria; Marie-Henriette Heiniken e Maria Deraismes, na França; Julia Apraxin, na Espanha; Salome Anderson, na Califórnia; Catherine Babington, na Carolina do Norte, dentre outras.[4]
Entre o final do Séc. XIX e início do XX, começam a surgir as potências maçônicas mistas (com homens e mulheres), a partir da Ordem Internacional “Le Droit Humain” (1893); e as femininas, como a atualmente chamada “Ordem das Mulheres Maçons” (1908), que, apesar de ter sido criada mista, logo restringiu-se a mulheres.
No Brasil, o GOB fundou quatro lojas femininas, entre 1901 e 1902, que não emplacaram. E, em 1963, o então Grão-Mestre Geral, Álvaro Palmeira, tentou instalar o Rito de Adoção no âmbito do GOB, tendo sido vetado pela Soberana Assembleia Federal Legislativa daquela potência.[5]
Já no final do Séc. XX, a Grande Loja Unida da Inglaterra – GLUI e outras passaram a reconhecer a regularidade de prática da Maçonaria Feminina, permitindo que estas lojas utilizem seus templos, rituais e paramentos. Em seu site, a GLUI, declara ter “uma excelente relação de trabalho”[6] com a Maçonaria Feminina.
Hoje, a Maçonaria Feminina trabalha em estreita relação (sem intervisitação) com a Masculina em diversos países e não há forma de ser contra isso sem que seja por preconceito. Isso por uma simples regra: se você é contra algo que não prejudica você nem ninguém, isso é preconceito. E enquanto a Maçonaria Mista oferece algum tipo de prejuízo à convencional, pelo caráter concorrencial, apoiar a Maçonaria Feminina somente oferece benefícios. Dentre eles, pode-se citar: atendimento a uma demanda social, proteção contra possíveis processos futuros por discriminação de gênero, mais renda às lojas proprietárias de templos maçônicos com dias ociosos, e a certeza de que nunca se sentará em loja com sua sogra.
[1] BLUMENTHAL, M. (Org.) Antigos textos maçônicos e rosacruzes. São Paulo: Isis, 2006.
[2] HUGHAN, W. J. The Old Charges of British Freemasons. London: Simpkin, Marshall&Co, 1872.
[3] ANDERSON, J. A Constituição de Anderson. Trad. Kennyo Ismail. Brasília: No Esquadro, 2023.
[4] COIL, H. W.; BROWN, W. M. Coil’s Masonic Encyclopedia. New York: Macoy, 1961, p. 15.
[5] ISMAIL, K. Maçonaria brasileira: a história ocultada. Vol. I. Brasília: No Esquadro, 2021.
[6] Disponível em: https://www.ugle.org.uk/become-freemason/women-freemasons
Excelente e esclarecedora materia, com sua permissão gostaria de postar no grupo de minha Loja. TFA.’.
Kennyo Ismail – Fique à vontade, meu irmão. TFA.
Meu querido Irmão Kennyo, como sempre, mais um texto sóbrio, mostrando a necessidade de todos nós fazermos uma reflexão interna sincera sobre mais um dos “tabus” da maçonaria.
Obrigado! TFA
Bom dia Ir.’. Kennyo Ismail. É com alegria que recebi este “Ensaio sobre um amanhã que há de ser outro dia”. Nesta semana, durante uma sindicância, de uma candidato à Iniciação Maçônica, na entrevista com a esposa do candidato, citei a Ordem Internacional “Le Droit Humain” que existe no Brasil desde 1918 e a Maçon Helena Blavatsky, autora da “voz do silêncio”. Grato pelo artigo que trouxe, para o meu conhecimento, outras mulheres maçons e a situação da maçonaria feminina no mundo atual. E, neste contexto, é interessante observar, que o questionário “Sindicância com a Esposa do Candidato” precisa ser atualizado, visto que, ainda hoje, as mulheres são vistas como “Do Lar” e não com potencial intelectual/laboral/espiritual, muitas vezes, superior ao dos homens. TFA.
Ser “do lar” não é uma afirmação de inferioridade.
Ser “do lar” expõe uma contraposição velada ao fato de que o juramento maçonico tradicional sujeita o maçon a pegar em armas e ao campo de batalha em defesa da maçonaria.
Não há família que sustente com ambos pais e mães enviados juntos para a Guerra.
Boa tarde, percebi um “tom” de crítica com a Maçonaria mista, estou correto?
gostaria de entender os prós e contra da feminina e da mista.
abraço!
Kennyo Ismail – Sim, está correto. O mainstream maçônico é masculino, tendo esse princípio há três séculos. As propostas de mudança desse princípio, feitas no final do século XIX e durante o século XX, foram descartadas pelo mainstream e aquelas jurisdições que a adotaram foram retiradas deste. Logo, ao descartarmos a possibilidade dessa mudança no mainstream, há apenas dois cenários para mulheres na Maçonaria: o primeiro, com a Maçonaria Feminina; e o segundo, com a Maçonaria Mista. Como já explicado no texto, o primeiro cenário não entra em choque com o mainstream (a Maçonaria Masculina), pois não demanda desta qualquer mudança em seus princípios. Por isso é algo que vem sendo aceito em muitas jurisdições. O segundo cenário, da Maçonaria Mista, entra em choque tanto com a Feminina quanto com a Masculina, sendo considerado como irregular por ambas.
Alegoricamente, imagine que tenho um campo de futebol com um banheiro masculino, onde homens o frequentam, jogando bola lá há mais de um século. Então, um grupo de mulheres entra em contato querendo utilizar o campo. Reservo um horário para elas, que usam as mesmas bolas e coletes que forneço aos homens. E a construção do banheiro feminino em nada impacta no masculino, que ficará intacto. O jogo das mulheres, em outro horário, também em nada impacta no dos homens. Se, em vez disso, eu resolvo economizar e simplesmente transformar o banheiro masculino em unissex, tanto os jogadores homens quanto as mulheres têm direito de discordar, pois isso impacta neles. E se digo que as partidas de futebol passam a ser mistas, sei que haverá, tanto homens quanto mulheres, que terão receio de jogar. Inclusive, algumas esposas de jogadores podem não gostar, bem como alguns maridos de jogadoras.
Entre essas duas opções, um banheiro feminino e horários reservados para o feminino, que jogam com as mesmas regras, bolas e coletes; ou um banheiro unissex e jogo misto com regras adicionais para reprimir contatos abusivos no banheiro ou no campo; prefiro a primeira opção. Não somente eu, como a FIFA.
Brasileiro entende muito bem quando se refere a futebol. Tanto é que quando tem algum comentário de uma determinada área, já relacionam que a área tem x campos de futebol. Isso, como se todos soubessem qual é a área de um campo de futebol. Mas vamos lá.
Sua explanação foi muito bem elaborada. Até o final do ano 2000, fui membro ativo do Lions Club de minha cidade. As reuniões eram mistas, mas as decisões era somente dos homens. Mas na hora de “pegar no pesado” eram elas quem tomavam a linha de frente.
Atualmente, não só os clubes são mistos (homens e mulheres leões ou leoas) como já vi mulheres sendo presidentes de clubes. O mesmo ocorre com o Rotary.
Esse é o futuro. Uma sociedade mista, composta de homens e mulheres onde um ou outro, no caso, uma ou outra, assume a coordenação/administração e, com igual competência (homem ou mulher) chegam ao objetivo traçado e esperado.
Entendo, acredito que faz sentido. Isso inclui a Le Droit Humain?
Pergunto, pois, das mistas, teria certa organização e tempo de existência.
O último parágrafo diz mais que o texto todo.
O mundo está mudando. Hoje, quem não está atualizado com as inovações e tecnologias, está “andando para trás”. Mas quem não está acompanhando as evoluções e ainda critica, ou, não aceita as inovações, além de estar “andando para trás” está tentando impedir o avanço dos demais.
Eu sempre digo em minha Loja. Posso até não estra vivo para presenciar, mas um dia há de ter tantas mulheres como homens em nosso Templo. Tem alguns IIr.’. que “torcem o nariz”, mas, inevitavelmente, é o que irá ocorrer em pouco tempo.
Qual é o critério primordial para ser Maçom? Ser livre e de bons costumes? Onde a mulher se exclui dessa premissa???
Muito interessante os procedimentos de algumas potencias maçônicas no Brasil e no Mundo. “Faço o que mando e não faça o que faço “, principalmente a GLUI que faz tudo que quer e critica outras potências por fazerem coisas que ela julga imoral…
Interessante falar de mulheres na maçonaria, GLUI tem relacionamento com as Mulheres Maçons, mas o resto do Mundo Maçônico é interpelado e crucificado por aventarem a existência de mulheres em seus quadros ou relacionamento indireto com elas.
“Faça o que mando, mas não faça o que faço”.