Infelizmente, história contada é história modificada. Isso porque a história é contada pelos sobreviventes e, via de regra, romanceada. E os maçons brasileiros, seres humanos como quaisquer outros, não fizeram diferente. Mas o compromisso maçônico da busca irrestrita e incessante da verdade faz com que alguns fatos, geralmente “esquecidos”, devam ser divulgados para que, pelo menos na Maçonaria, conheça-se a história real.
A história que quase todos os historiadores maçons contam é sempre a mesma e é mais ou menos assim: Em 1815, nove maçons fundaram Rio de Janeiro a Loja “Comércio e Artes”, a Loja Primaz do Brasil. Então, depois de alguns anos, em 1822, a Loja já contava com 94 membros, então resolveram dividir a Loja em três e fundar o Grande Oriente Brasileiro, primeira Obediência Maçônica no Brasil.
Na verdade, a Maçonaria brasileira não nasceu no Rio de Janeiro e nem tampouco lá foi o berço da primeira Obediência Maçônica. E, evidentemente, a Loja “Comércio e Artes” nunca foi a “Loja Primaz” do Brasil. Na verdade não foi nem a décima, quanto mais a primeira.
Apesar dos esforços de muitos autores maçons em negar isso, o pioneirismo maçônico brasileiro nasceu no Nordeste, mais precisamente na Bahia. A primeira cidade do Brasil também foi berço da primeira Loja Maçônica: “Cavaleiros da Luz”, fundada em 1797. Nada mais justo. Se quase tudo no Brasil começou lá, por que na Maçonaria seria diferente? O historiador e maçom Borges de Barros, que foi diretor do Arquivo Público da Bahia e relatou pela primeira vez a existência dessa Loja, ainda deu conta de que a Loja “Cavaleiros da Luz” foi a chama principal da Conjuração Baiana. Nada mal para os nossos pioneiros!
Mesmo com a dissolução dessa primeira Loja, com o passar dos anos a Maçonaria foi se desenvolvendo no fértil solo baiano: em 1802 surgiu a Loja “Virtude e Razão” que, depois de breve tempo adormecida, foi reerguida com o nome “Virtude e Razão Restaurada”, na mesma época em que, também de seu espólio, surgiu a Loja “Humanidade”. Ainda no Nordeste, não demorou para que a luz maçônica iluminasse, por influência da Bahia, o Estado de Pernambuco.
Sobre Pernambuco, é necessário aqui um comentário à parte:
Apesar de muitos escritores maçons assim desejarem, a “Areópago de Itambé” não era uma Loja Maçônica. No século XVIII existiam centenas de instituições criadas aos moldes da Maçonaria, usando símbolos iguais e similares, e até dividindo os graus em Aprendiz, Companheiro e Mestre como na Maçonaria. Era uma verdadeira “coqueluche” de Ordens, Clubes e Associações, e era muito comum os homens livres serem membros de duas ou mais dessas diferentes instituições, até mesmo no Brasil. Um exemplo disso é o “Apostolado”, da qual José Bonifácio, Gonçalves Ledo e D. Pedro I também faziam parte. Ser inspirada na Maçonaria não é o mesmo do que ser Loja Maçônica.
Em 1809, atendendo às inúmeras Lojas que já existiam, foi fundado em Salvador o “Governo Supremo” ou simplesmente “Grande Oriente”, a PRIMEIRA Obediência Maçônica brasileira. Não era um “Grande Oriente da Bahia”, como os poucos historiadores maçons que o citam costumam se referir, pois era composto de, pelo menos, 09 Lojas: 03 na Bahia, 04 em Pernambuco e 02 no Rio de Janeiro. Maçons portugueses e brasileiros, muitos deles iniciados na França e Portugal, eram membros dessas Lojas. Tudo isso 06 anos antes da fundação da “Comércio e Artes” e 13 anos antes do GOB. Pernambuco, por contar com maior número de Lojas, ganhou em 1816 uma Grande Loja Provincial filiada ao “Governo Supremo”.
Interessante observar que mais uma vez a Maçonaria se fez presente na história: um dos responsáveis pela formação do Governo Supremo e tido como primeiro Grão-Mestre da Grande Loja Provincial de Pernambuco, Antônio Carlos de Andrada, foi o líder da Revolução Pernambucana, em 1817. Prova maior do papel decisório da Maçonaria no movimento é a lei régia de 1818 proibindo sociedades secretas no Brasil.
Antes que alguém tente justificar a constante omissão de tais fatos nas “versões oficiais” da Maçonaria brasileira por conta dessas Lojas e Obediência não terem sido regulares, é importante observar que a Loja “União”, fundada em 1800 no Rio de Janeiro e sempre presente nas versões históricas, também era irregular. Somente após a adesão de algumas autoridades públicas, ela foi “refundada”, aparentemente de forma regular, e teve seu nome modificado para Loja “Reunião”. Até mesmo a histórica Loja “Comércio e Artes” foi fundada sem Carta Constitutiva em 1815 e trabalhou de forma irregular até 1818, quando foi fechada. Somente quando de seu reerguimento, em 1821, a “Comércio e Artes” se filiou ao Grande Oriente Lusitano.
Isso só nos mostra que a história da Maçonaria no Brasil é, muitas vezes, contada conforme a conveniência, omitindo os verdadeiros pioneiros em favor dos sobreviventes, ou lembrando deles quando se quer apontar a Maçonaria como protagonista das conjurações. Também é no mínimo intrigante como a Maçonaria esteve presente nos movimentos revolucionários baiano e pernambucano, mas tantos historiadores maçons e não-maçons fazem questão de negar sua participação na Inconfidência Mineira. Mas isso é tema pra outra ocasião.
O importante é reforçar que, antes de fundada uma Loja situacionista, a qual originou a Obediência que promoveu a independência sob a manutenção do imperialismo no Brasil, houveram várias outras Lojas e até Obediências oposicionistas, e muitos de seus membros morreram ou sofreram duras penas defendendo os princípios maçônicos de liberdade e democracia. E a Maçonaria brasileira de hoje tem o dever moral de honrar essa história.
Basicamente, foi trazida por quem? portugueses?
Franceses, portugueses e brasileiros que foram estudar na França e em Portugal, iniciaram por lá e retornaram ao Brasil.
Lembando que estes maçons eram ligados ao Grande Oriente da França e ao Grande Oriente Lusitano, a Maçonaria Continental, Liberal e Adogmática. Fica fácil entender porque os antigos maçons estavam envolvidos em todos os movimentos por liberdade na América Latina. Também é fácil entender porque a Maçonaria brasileira atual não tem mais esta pujança, se transformando em uma clube de negócios e apoiando govenos ditatoriais, se afastaram da Maçonaria Liberal e se aproximaram da Maçonaria Conservadora, a anglo-americana, representada pela GLUI e as Grandes LOjas dos EUA.
Acho que seria de bom alvitre termos um post sobre a Inconfidência Mineira, não?
De resto, parabéns pelo belo blog que tem me servido de fonte de lazer e pesquisa já há algum tempo.
TFA
Parabéns, belo trabalho.
Ir.Kennyo
Essas primeiras lojas na Bahia funcionavam em qual rito (Escocismo, Adonhiramita) ???
Fraternal Abraco!
eu pergunto:de fato em que pode a maçonaria nos acrecentar em relaçao a verdadeira fe,se esta mesma e pura e imutavel!
cristo e a unica verdade!
e a mais pura verdade e que o homem nao precisa da maçonaria para ser melhor!
pensem nisso!
Kennyo Ismail – Acrescentar em relação a fé? Nada. Já é exigido que o candidato acredite em um Ser Supremo antes de seu ingresso na Maçonaria. Maçonaria não é um sistema espiritual. Maçonaria é um sistema moral. Espiritualidade é uma coisa e moralidade é outra. Maçonaria ajuda o homem a se tornar um homem moralmente melhor. Já espiritualmente melhor, ele deve buscar em sua religião ou conforme suas crenças.
Excelente texto, como historiador e maçom adoro ler o lado oculto da história do nosso país e da maçonaria.
Parabéns pelo trabalho meu Irm.’. ,muito esclarecedor.TFA
A História da Maçonaria para adultos
EM QUAL DOCUMENTO PODEMOS ESCUDAR-NOS QUANTO ESSA AFIRMAÇÃO HISTÓRICA? COMO O POEMA REGIO DE 1390 SERIA O ÚNICO DOCUMENTO QUE REFERENCIA A MAÇONARIA ANTIGA E OPERATIVA. QUANTO AO BRASIL TERÍAMOS ALGUM?
Kennyo Ismail – nos artigos de história relativos a Revolução Industrial isso está muito claro. Sobre o Poema Régio ser o único documento que referencia a Maçonaria Antiga, isso não é verdade. Há vários, inclusive mais antigo, como a Carta de Bolonha. Aqui no blog há um post sobre isso.
Adorei muito!saber de todas essas verdades,sobre a maçonaria.foi muito bom!
Por que nas grades de janelas e portas da casa da cultura de recife, antiga cadeia pública está gravado o olho que tudo vê. Gostaria de poder anexar a foto?
Kennyo Ismail – Não sei. Boa pergunta…
Prezado Ir.’. Faltou mencionar que a primeira loja foi criada numa embarcação, ancorada nas imediações da Baia de Todos os Santos, próximo do atual Farol da Barra.
T.’.F.’.A.’.
Fabricio Lima
Or.’. Guanambi Ba
Assim como desde novo fui encantado pela maçonaria, e pela tempo propicio tive a oportunidade esse ano receber um convite de um enviado para ingressar na COMAB, sou do amazonas, e acredito que será uma nova forma de vida.
obrigado pelo partinha, amor e luz a todos e que o Eterno os veja.
Meu bisavô era pioneiro,na época de 1921 ele era judeu sera que ele pode ter sido algum dos fundadores das lojas aki no Brasil ?
Kennyo Ismail – Prezada Vitoria, em 1921 a Maçonaria brasileira já tinha mais de 100 anos de existência.
Bom dia, a primeira loja pode até ter sido fundada no Nordeste, mas não foi na primeira cidade do Brasil, pois São Vicente, não fica na Bahia. Acredito mais que a primeira loja organizada tenha aparecido em SP.
Kennyo Ismail – Entendo seu raciocínio, mas acredito que vila não seja considerado cidade. Não há indício de Loja em SP antes de BA, PE e RJ.
Meu irmão, vc poderia passar pra nós a bibliografia de tais informações! Adoro a história da Maçonaria no Brasil, alias, como se confundem a todo instante a história da Maçonaria e a do Brasil.
Ja realizei alguns trabalhos sobre o tema, um doa temas que mais me despertou interesse foi a abolição da escravatura!
Obrigado
TFA
Kennyo Ismail – Meu Irmão João Roberto, há no blog um menu superior horizontal com indicação de literatura. Tenho um livro sobre o tema, que será publicado entre junho e agosto, muito bem referenciado, que poderá ajudar em suas pesquisas para futuros trabalhos. TFA.
Indicar as fontes bibliograficas e documentais em seus posts transmitiriam maior sobriedade as publicações. E não por desconfiança, mas por boa técnica de pesquisa.
Kennyo Ismail – Como professor universitário e pesquisador entendo um pouco disso. Mas isto aqui é um blog, com textos informais para leitura rápida e acessível. Para quem quiser se aprofundar nos estudos, as fontes estão nos meus artigos e livros, esses sim que devem e são bem referenciados.
Que bom que sempre teremos uma loja maçônica para cuidar das pessoas que precisa
Adorei a história de nossa Maconaria, parabéns ao historiador que deslumbra do conhecimento .
Parabenizo o autor dessa salutar peça de arquitetura.
muito bom, sou aprendiz adoro saber da historia do Brasil e tambem da historia da maçonaria, a qual contribuiu para os momentos politicos do Brasil.
“A VERDADEIRA HISTÓRIA DOS PRIMÓRDIOS DA MAÇONARIA NO BRASIL”
Elucidador, parabéns.
Informação incorreta: O Areópago de Itambé foi a primeira loja maçônica do Brasil, fundada no ano de 1796 em Itambé, Pernambuco, por Manuel Arruda Câmara.
Kennyo Ismail – Informação incorreta. Areópago de Itambé não era uma loja maçônica.