No dia 12/01 estive em visita à sede da Grande Loja de Cuba, um prédio edificado para abrigar a administração da Maçonaria Cubana. O destacado edifício, que possui em seu ápice um gigantesco globo terrestre coroado com o esquadro e o compasso, foi construído no coração de Havana com o suor dos mais de 30 mil maçons cubanos e inaugurado em 1955, teve na década de 60 a maioria de seus andares desapropriada pelo governo cubano em nome dos “melhores interesses do Estado”. Não obstante, a Grande Loja, apertada nos 30% que lhe restou de seu próprio edifício, seguiu sua trajetória em prol da sociedade, dedicando boa parte de seu espaço a uma biblioteca pública com mais de 45 mil publicações e um museu maçônico.
Durante as décadas de 60 e 70, a Maçonaria Cubana, então formada por homens das classes mais abastadas, viu seu número reduzir quase pela metade com a migração das elites para os Estados Unidos e outros países. Para sobreviver, a Grande Loja viu a necessidade de se reinventar, democratizando o ingresso à Ordem. Hoje, com mais de 29 mil membros e de 300 Lojas, é a maior Grande Loja da América Latina e Caribe, seguida por perto da Grande Loja do Estado de São Paulo.
Tive a oportunidade, nessa visita, de ser recepcionado pelo Mui Respeitável Grão Mestre da Grande Loja de Cuba, Irmão Evaristo Rubén Gutiérrez Torres, intelectual dedicado à Sublime Ordem; o Grão Mestre Adjunto, Irmão Julio Alberto Rojo Pumar, importante maçonólogo cubano; o Grande Secretário, Irmão Asdrubal Adonis Pages Manals; o Grande Secretário de Relações Exteriores, Irmão Raimundo Gomez Cervantes; e o Grande Orador, Irmão Alberto Perez Fiallo. Após a fraterna e calorosa recepção, fui convidado a assinar o ilustre livro de visitantes do exterior, concessão essa que muito me honrou.
Atendendo a convite do Grão Mestre Adjunto, participei no dia 24/01 de reunião conjunta de 15 Lojas em Templo localizado em Calabazar, na periferia de Havana, onde pude presenciar o desdobramento de uma ritualística impecável e uma excelente palestra, além dos reportes da filantropia (desde campanhas de doação de sangue até apoio a crianças enfermas) e demais atividades das Lojas presentes. 50% do recolhido no Tronco de Solidariedade foi destinado, como de costume, ao Asilo Nacional Maçônico, fundado em 1886, o qual tem o apoio institucional da Grande Loja e direção do Supremo Conselho.
Sinto-me imensamente feliz em ter podido presenciar uma Maçonaria que, apesar de todas as adversidades, serve de exemplo no cumprimento dos deveres maçônicos de Fraternidade, Caridade e busca pela Verdade. Uma Maçonaria com média de mais de 90 membros por Loja e com uma Loja em Havana com mais de 400 obreiros (uma única Loja com mais maçons do que nos países de Nicarágua, Costa Rica e Panamá). Uma Maçonaria que mantém um Asilo que abriga mais de 90 famílias. Uma Maçonaria com uma biblioteca que, provavelmente, tem o maior acervo maçônico da América Latina e Caribe e que conta com uma Academia de Altos Estudos Maçônicos com produção pujante e de qualidade.
Excelente viagem e experiência marcante em Cuba, mano Kennyo!
Quais ritos se praticam em Cuba? Salvo engano, pelo avental de alguns irmãos, parece que praticam o rito de York.
TFA
Kennyo Ismail – Meu Irmão Henri, em Cuba se pratica o REAA e o Rito de York. No entanto, por questões históricas, mesmo as Lojas Simbólicas do REAA utilizam paramentos do Rito de York, além de outras características do Rito de York, como a presença de duas portas no templo, posição dos candelabros, ritual decorado, etc.
Cuba é uma situação interessante pois foi a única ditadura socialista que não perseguiu efetivamente a maçonaria, que tinha sido condenada desde a III Internacional.
Mas o preço dessa tolerância parece ser alto, primeiro com o exílio de uma grande leva de maçons no pós-revolução e depois com a aparente infiltração da Ordem por agentes e dedos-duros do governo, como foi o caso do ex-Grão Mestre, Juan Manoel Collera.
Kennyo Ismail – Meu Irmão Edgard, bem observado. Quanto ao raciocínio de que a Maçonaria cubana paga um preço caro pela tolerância governamental, visto o exílio de maçons, entendo que o raciocínio está invertido, visto que a migração não ocorreu por conta da Maçonaria, e sim por questões ideológicas, busca por melhores oportunidades, melhor qualidade de vida, reunião familiar, etc. Assim como os maçons brasileiros que se mudaram e mudam para os EUA não foram por conta da Maçonaria e sim por motivos similares. Cabe acrescentar também que nos países democráticos não é isenta a possibilidade de setores de inteligência voltarem seus olhos à sociedade civil organizada, como a Maçonaria. Se observarmos bem, o governo cubano chega a ser mais tranquilo com a Maçonaria do que o governo inglês, que já aprovou leis antimaçônicas. E olha que estamos falando do país da Grande Loja Unida da Inglaterra, que a Maçonaria brasileira gosta de superestimar.
Na verdade o ponto sobre o exílio tem uma razão de ser: por mais que o governo cubano não tenha perseguido a maçonaria enquanto tal e nem os maçons por esta condição o ambiente político e social em Cuba é hostil à dissidência. Grosso modo existem 12 milhões de Cubanos no mundo, e 1 milhão vive no exílio. A repressão política ainda existe. Sendo assim é razoável supor que a maçonaria local (à parte não dever tomar partido político) também não deva ser um ambiente tão seguro assim para ser livre (como bem demonstrou o caso de Collera Vento), aquele “espaço de sociabilidade” que permite que os diferentes se nivelem.
Mais ou menos como aquela piada: todos são livres para serem a favor do governo e contra os EUA.
Kennyo Ismail – Edgard, entendi seu raciocínio, mas ele parte da suposição de que 1 milhão de cubanos vivem “no exílio” e são dissidentes. Que todos saíram por questões políticas. Enquanto que muitos dos cubanos que vivem fora de Cuba não se consideram “exilados” e nem mesmo dissidentes. São como muitos mexicanos que migraram para os EUA. Por isso entendo não ser razoável essa suposição. Ainda, sobre se a Maçonaria seria ou não um ambiente tão seguro para ser livre, entendo que não só a Maçonaria como qualquer outro lugar seria. Organismos considerados de oposição são permitidos em Cuba, como o “Damas de Branco”, por exemplo, que sempre que faz uma manifestação pública conta com a proteção do Estado. Ou o veículo de comunicação 14ymedio, publicamente de oposição, e que possui registro e endereço fixo, etc. Há também o Cinema Cubano, muito apreciado tanto dentro como fora de Cuba, que possui financiamento do Estado e tem um viés bastante crítico ao sistema. Ou seja, a liberdade de expressão em Cuba pode não se comparar à do Brasil de hoje, mas é bem maior do que o que tínhamos aqui há alguns anos, por exemplo. Destaco aqui que sou totalmente crítico ao atual sistema político e econômico de Cuba. Argumento apenas nesses pontos em que acredito que a realidade difere da imagem que nos é vendida pela mídia.
olá e boa noite,
meus IIRR.’.
sensacional a aproximação e unificação da Maçonaria… na América…
SFU e 1 TFA.’.
Osni
Interessante essa observação sobre o ritual do REAA ser decorado em Cuba, meu irmão.
Já questionei alguns irmãos sobre a possibilidade do ritual ser praticado de forma decorada para o enriquecimento e embelezamento do mesmo na sessão. Alguns irmãos justificaram que é praticamente impossível decorar todas as fórmulas do REAA, principalmente em sessões magnas, pelas fórmulas serem muito extensas. Não sei quão extensa é a ritualística do rito de York e do ritual de emulação para que possam ser decoradas pelos irmãos anglo-saxões. Será que esses rituais são mais concisos e que facilita na memorização ou são tão extensos quanto os rituais do REAA e é necessária perseverança e boa-vontade para tal empreendimento?
Kennyo Ismail – Meu Irmão Henri, abordamos esse tema em um post aqui do blog tempos atrás. Os volumes de frases entre os Ritos é similar e posso garantir que não é praticamente impossível decorá-los. Convide os irmãos a visitarem uma elevação no Capítulo DeMolay mais próximo e verão do que estamos falando. Ou convide-os a assistir uma novela e verificar o volume de frases que o protagonista decorou para um único episódio, sendo que é um episódio diferente todos os dias e cada dia com dezenas e dezenas de frases a serem decoradas, que NUNCA serão repetidas. Já no caso da Maçonaria, o Irmão repetirá a maioria das frases toda semana por, pelo menos, um ano inteiro. Alguns cargos têm apenas duas ou três frases curtas. Seria também impossível decorá-las? Acredito que não. Aliás, não somente acredito como sempre fiz meus cargos de memória, inclusive de VM, e não sou extraterrestre.
Ótimo texto, visto que a maçonaria pode operar em regimes quaisquer que sejam. Em minha Loja, teremos a presença de um Ir. de Cuba, devidamente com seu passaporte maçônico em dia, será de ótima valia ter uma opinião de alguém de dentro, rs.
Caro mano Kennyo, estive em Cuba em maio de 2002, acompanhando uma comitiva presidida pelo Grão-Mestre Geral do Grande Oriente do Brasil, com 58 irmãos.
Fomos prestigiar a posse do irmão Romay, então GM do GO-RJ, no cargo de garante de amizade da Grande Loja de Cuba junto ao GOB. Estivemos no sede central, visitamos a biblioteca e participamos de uma reunião de uma loja que funciona na sede da GL. Realmente é admirável o trabalho desenvolvido pelos maçons cubanos, na área da educação, da cultura e da filantropia. HPL
Também estive participando de uma sessão em Cuba no ano de 2012, na sede da Grande Loja em Havana e visitando um Templo em Matanza. Incrível a solidariedade entre eles, fazem tanto com tão pouco.
Gostaria de comunicar-me com a Maçonaria de Havana.
Pois só assim poderemo nos conhecermos como Irmãos.
A Maçonaria Cubana, a meu ver, está desfigurada em seus objetivos. O maçom é um homem livre e de bons costumes que se propõe a praticar virtudes, entre elas o combate à tirania. Se na ilha-presídio existe liberdade, eu não sei o que é estar preso. Se os irmãos Castro não são tiranos, não sei quem mais poderia ser.
Pelo que vejo, a Maçonaria Cubana apenas sobrevive da maneira como o regime totalitário permite sobreviver. Até os rituais são submetidos à censura.
Kennyo Ismail – Talvez uma citação duma Constituição maçônica antiga possa ajudar a esclarecer a posição correta da Maçonaria: “Um maçom é uma pessoa pacífica, sujeita às autoridades civis, onde quer que resida e trabalhe, e nunca deve tomar parte em planos e conspirações contra a paz e o bem-estar da nação, nem se portar sem o devido respeito aos magistrados… Assim, se um irmão rebelar-se contra o Estado, ele não deve ser apoiado em sua rebelião… embora a leal fraternidade deva e necessite renegar sua rebelião, e não ofender ou dar motivos ao Governo, sob estas circunstâncias, para desconfiança política, ela não pode expulsá-lo da Loja, e sua relação com ela permanece irrevogável.” Textos similares estão presentes em todas as Constituições de Obediências pelo mundo todo. Em outras palavras, meu Irmão, não é papel da Maçonaria lutar contra governos instituídos. Ela não deve fazê-lo. O maçom pode fazê-lo enquanto cidadão, como foi feito nas revoluções francesa e no continente americano, mas não enquanto maçom.
Mas meu irmão, Cuba tem paz e bem estar social? O regime dos irmãos Castro proporcionou isso àquela nação? Fuzilamentos, prisões e torturas processados sumariamente, além de toda sorte de repressão política podem ser consideradas normais pela nossa Ordem? Quais valores reiteramos cada vez que abrimos e fechamos nossos trabalhos? É possível separar em duas metades o cidadão que anseia justiça e liberdade do maçom que ele é? Ou não constituiriam os dois um único e indissolúvel amálgama? Por que a Maçonaria abraçou as divisas da Liberdade, Igualdade e Fraternidade, tomados da Revolução Francesa?
Concordo em ser pacífico, mas não em ser passivo. Não foi essa a lição que aprendi nos meus rituais. Fidel Castro tolerou a Maçonaria em Cuba apenas para vigiá-la de perto, mas o certo seria ela dissolver-se ou entrar na clandestinidade para preservar os valores que prega. Onde prevalecer o Esquadro e o Compasso não haverá lugar para a foice e o martelo, sendo igualmente verdadeira a recíproca.
Grande abraço.
Kennyo Ismail – Meu Irmão Eugênio, mais uma vez, não podemos confundir o dever do maçom com o dever da Maçonaria. O dever da Maçonaria é ensinar sua filosofia ao maçom. O dever do maçom é lutar pelo que ele acredita ser certo. Quem vai à luta, seja a favor ou contra algo, é o maçom. Nunca a Maçonaria. A Maçonaria, em seu conceito da Coil’s Encyclopedia, defende a “busca da verdade, mas não define a verdade” e ainda “é modesta e não militante”. Assim, entendo que a Grande Loja de Cuba tem cumprido seu dever, de fornecer um sistema de moralidade aos seus membros. E todas as Obediências Maçônicas regulares no mundo têm concordado com isso. Se um maçom cubano entende que deve lutar contra algo que ele acredita não estar correto, ele é livre para fazê-lo, mas sem usar a Maçonaria ou o nome da mesma para tal. E a Maçonaria deve respeitar sua opinião, não devendo excluí-lo por isso. É o que diz as Old Charges.
Muito interessante sua postagem nunca tive o prazer em ver publicacões sobre a Maconaria na Ilha de Cuba pois oimaginava que tal regime não aceitava nossa Fraternidade pelos dogmas que seguimos muito louvavel seu esclarecimentos unica coisa que tenho a lhe perguntar quais os ritos que eles possuem e se a liturgia e a mesma que são adotadas no Brasil parabens aos irmãos cubanos por manterem na Fraternidade com todos os problemas do pais e a voce pela publicacão muito esclarecedora.
Excelente texto! Bem esclarecedor e suas respostas ao comentários foram melhores ainda. Tanto na sua postagem, quanto em fotos do Google, percebe-se que em Cuba os maçons não usam terno, correto? Por que? Ou eles usam, mas não constou em fotos?
Fraternal abraço!
Kennyo Ismail – Em muitas localidades não se usa terno, sendo permitido uma maior informalidade na vestimenta. Considera-se que a vestimenta do maçom é o avental.